terça-feira, 25 de agosto de 2009

Início de um conto que ainda não consegui terminar...

Abriu os olhos. O barulho das máquinas a trabalhar na praceta parecia-lhe agora ensurdecedor, como aviões que aterram num cenário de guerra. Sentiu que a cabeça lhe martelava como se estivesse no interior de uma fábrica. O tiquetaque ritmado do relógio na mesa-de-cabeceira irritava-o solenemente, como os passos de um criminoso num filme de terror, um criminoso que o perseguia nem ele sabia muito bem porquê.
Voltou a cerrar os olhos e puxou o edredão de penas de modo a cobrir a cabeça na esperança vã de voltar a dormir. Sabia que era impossível regressar ao sono. Aliás, sabia perfeitamente que a terrível dor de cabeça que o acompanhava não iria passar só porque a escondia debaixo dos cobertores. Olhou novamente o relógio irritante sobre a mesa-de-cabeceira. Passava pouco das nove e vinte. Talvez nove e vinte e três, mais coisa menos coisa.
A boca tinha um gosto estranho… o gosto próprio de quem bebeu e fumou demais na noite anterior. Na juventude, os amigos costumavam dizer que tinham a boca a saber a papel de música, uma comparação perfeitamente ridícula já que não conhecia ninguém que alguma vez tivesse comido papel de música para saber o seu verdadeiro gosto. O facto era que a boca tinha um estranho paladar e, à falta de melhor, sabia-lhe a papel de música.
Decidiu levantar-se, fazer um café forte e tomar um comprimido para tentar por cobro aquela maldita dor que lhe martelava a cabeça. Saiu da cama com a mesma vontade que teria um condenado à cadeira eléctrica. Apetecia-lhe ficar deitado e dormir o resto do dia, se possível o resto da vida. Acordar e levantar-se seria apenas o continuar de algo que queria apagar e não voltar a viver.

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